segunda-feira, 9 de maio de 2011

Conversa de botequim - final -

     Já fui um habituê de bares e botecos da vida. Um grupo de pessoas afins, bebida honesta e barata, tiragostos nem tão honestos, uma variedade eclética de assuntos com a predominância do cinema. O palco pronto, o contra regra à espera de um branco inesperado, a platéia sem muito interesse degustando seus próprios dramas.
    
     Um item mais que essencial: a democratização do espaço social circulante. Melhor: o anarquismo do espaço social circulante.

     Andei por muitos. Antônio s no Rio em minha pós adolescência, Bracarense nos setenta, Bar do Cardoso e Bife Sujo por essas bandas. Ainda não havia a desagradável vizinhança de celulares de última geração com criaturas penduradas neles, vociferando em voz alta seus status ou brigas domésticas que deveriam ser restritas ao sacrosanto lar ou entre quatro paredes.
     Hoje prefiro meus poucos amigos em minha casa, jogando conversa fora ou vendo clássicos de Bergman ou Fellini, sabendo que os possíveis vizinhos estão do outro lado da parede.
     Minha ligação com eles é de cunho mais prático. Quando a venda de meus livros caem a ponto de ameaçar minhas buscas frenéticas a sebos atrás de edições raras de livros e HQs, visto meu uiniforme de pinguim e durante um tempo vou servir mesas e rosnar em voz alta para clientes chatos. Não é um bar frequentado por moças de boa estirpe. Mas dali tirei noventa por cento dos personagens de meus livros. Uma troca justa, portanto.

   E bêbados são chatos. Sempre tive a esperança de encontrar alguns como Albert Finney no filme À Sombra do Vulcão do Houston ou Antônio Pedro no Bar Esperança, do Carvana. Doce esperança.

     Eu disse que evitaria inserir trechos de meus livros aqui neste espaço, mas no presente caso, acho relevante. O personagem principal é fotógrafo de um jornal matutino além de cronista semanal. É parte de uma crônica sobre bares que cabe no último capítulo deste seriado. O livro é "Mas não se matam putas?".

     " Roniquito ( em voz alta pelo burburinho do bar": Callado!
     " Callado ( Antônio Callado ( autor de Quarup entre outros):  O que é Roniquito?
     " Roniquito: Callado, quem escreve melhor, você ou Faulkner? ( Willian Faulkner, autor de O Som e a Fúria)
     " Callado: É claro que é o Faulkner Roniquito.
     " Roniquito( elevando mais a voz): Callado, e quem é você para se comparar a Willian Faulkner?
          ( Diálogo acontecido no Antônio s, na década de sessenta, narrado pelos cronistas da época)

     " Os bares viram lendas. Quando isso acontece, só existem duas saídas: ou fecham as portas e passam a fazer parte do inconsciente coletivo alcóolico ou passam a ser frequentados pela pior escória a partir da lenda: a classe média.

     " O bar é uma instituição necessária à humanidade. Como hospitais e casas de tolerância. O dono do bar é um enfermeiro de almas solitárias e sócio minoritário nas dores de corno, na alegria da volta da mulher amada, no nascimento de um rebento esperado.

     " Terminando, meu paciente leitor, fuja dos bares que exigem comportamento de uma casa de chá. Como diria meu conterrâneo Paulo Mendes Campos, os donos dessas espeluncas deveriem ser pendurados de cabeça para baixo em praças públicas.

     " Agora minha última dica, meu desavisado leitor/leitora: quando alguém te convidar para um barzinho, com intenções sexuais ou não, faça com ele/ela o seguinte teste: quem disse as frases abaixo.

     a) impus-me a obrigação de nunca beber enquanto é dia claro e de não recusar bebida depois do anoitecer;
     b) quando tomo um drinque, me sinto outro homem, e este novo homem pede logo um drinque;
     c) na verdadeira noite escura da alma, são sempre três horas da madrugada;
     d) você é um bêbado, como um grande número de escritores. Não passa disso;
     e) todo homem está duas doses abaixo da humanidade.

     " Se ele/ela não souber de pelo menos uma delas, com certeza é um bêbado amador, ou seja, um chato de galocha. Se mesmo assim você não pular fora, vossa senhoria é tão ou mais idiota do que quem te convidou.
      Respostas do teste:
      a) H.L. Mencken
      b) Chesterton
      c) Scott Fitzgerald
      d) Hemingway para Fitizgerald
      e) Humphrey Bogart.  




            

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